Tocado
o coração logo se agita
e arqueja 'Amor'
um peixe alucinado que tenta
tirar seu fôlego da carne do ar
E não há ninguém ali para escutar sua morte
no meio das moitas tristes
por onde o mundo passa em riste
numa efusão de atrasos e de asfalto
Lawrence Ferlinghetti
no livro Um parque de diversões da cabeça
sexta-feira, 31 de julho de 2015
Em toda minha vida jamais deitei com a beleza
confidenciando a mim mesmo
seus encantos exuberantes
Jamais deitei com a beleza em toda minha vida
e tampouco menti junto a ela
confidenciando a mim mesmo
como a beleza jamais morre
mas jaz afastada
entre os aborígenes
da arte
e paira muito acima dos campos de batalhas
do amor
Ela está acima disto tudo
oh sim
Está sentada no mais seleto dos
bancos do templo
lá onde os diretores de arte encontram-se
para escolher o que há de ficar eterno
E eles sim deitaram-se com a beleza
suas vidas inteiras
E deliciaram-se com ambrosia
e sorveram os vinhos do paraíso
Portanto sabem com precisão
como algo belo é uma jóia
rara rara
e como nunca nunca
poderá desvanecer-se
num investimento sem tostão
Oh não jamais deitei
em Regaços da Beleza como esses
receoso de levantar-me à noite
com medo de perder alguma forma
algum movimento que a beleza pudesse esboçar
No entanto dormi com a beleza
da minha própria e bizarra maneira
e aprontei uma ou duas cenas muito loucas
com a beleza em minha cama
e daí transbordou um poema ou dois
e daí transbordou um poema ou dois
para esse mundo que parece o de Bosch
Lawrence Ferlinghetti
no livro Um parque de diversões da cabeça
confidenciando a mim mesmo
seus encantos exuberantes
Jamais deitei com a beleza em toda minha vida
e tampouco menti junto a ela
confidenciando a mim mesmo
como a beleza jamais morre
mas jaz afastada
entre os aborígenes
da arte
e paira muito acima dos campos de batalhas
do amor
Ela está acima disto tudo
oh sim
Está sentada no mais seleto dos
bancos do templo
lá onde os diretores de arte encontram-se
para escolher o que há de ficar eterno
E eles sim deitaram-se com a beleza
suas vidas inteiras
E deliciaram-se com ambrosia
e sorveram os vinhos do paraíso
Portanto sabem com precisão
como algo belo é uma jóia
rara rara
e como nunca nunca
poderá desvanecer-se
num investimento sem tostão
Oh não jamais deitei
em Regaços da Beleza como esses
receoso de levantar-me à noite
com medo de perder alguma forma
algum movimento que a beleza pudesse esboçar
No entanto dormi com a beleza
da minha própria e bizarra maneira
e aprontei uma ou duas cenas muito loucas
com a beleza em minha cama
e daí transbordou um poema ou dois
e daí transbordou um poema ou dois
para esse mundo que parece o de Bosch
Lawrence Ferlinghetti
no livro Um parque de diversões da cabeça
quarta-feira, 22 de julho de 2015
terça-feira, 14 de julho de 2015
Eternidade
Ele reviu-se:
não era mais
nem corpo
nem sombra
nem escombros.
não era mais
nem corpo
nem sombra
nem escombros.
Como foi isso?
Tudo irreal:
um barco
sem mar
a boiar.
Tudo irreal:
um barco
sem mar
a boiar.
Ele sentiu-se:
recomeçava.
Vivera
morrendo
numa estrela.
recomeçava.
Vivera
morrendo
numa estrela.
Ele despiu-se
de quê?
De tudo
que amara.
Surdo-mudo
cegara.
Agora vê.
de quê?
De tudo
que amara.
Surdo-mudo
cegara.
Agora vê.
Jorge de Lima
segunda-feira, 6 de julho de 2015
valquírias
viverei mil anos na galícia de tuas coxas,
teu pólen serão as ilhas onde descansarei
os navios apedrejados de minha esperança.
nos teus olhos, um enjambement de lírios,
nos teus quadris, minha galáxia herdada.
não falemos, então, nada além dos olhos,
firmarei em teus olhos minha vaga nação.
em sarabandas lunares repaginar carícias,
virar do avesso a ruína do segundo parto.
dentro de ti serei sempre o pastor anfíbio
e a violência explodirá em sutis enxadas,
enxadas e pisadas sobre nuvens velozes
e já não estaremos mais entre os mortos.
pelo instante em que tocarmos as pontas
do nosso milagre comum, afirmaremos
a comunhão das espécies e o sono do fim.
Leonardo Marona,
no livro "óleo das horas dormidas"
teu pólen serão as ilhas onde descansarei
os navios apedrejados de minha esperança.
nos teus olhos, um enjambement de lírios,
nos teus quadris, minha galáxia herdada.
não falemos, então, nada além dos olhos,
firmarei em teus olhos minha vaga nação.
em sarabandas lunares repaginar carícias,
virar do avesso a ruína do segundo parto.
dentro de ti serei sempre o pastor anfíbio
e a violência explodirá em sutis enxadas,
enxadas e pisadas sobre nuvens velozes
e já não estaremos mais entre os mortos.
pelo instante em que tocarmos as pontas
do nosso milagre comum, afirmaremos
a comunhão das espécies e o sono do fim.
Leonardo Marona,
no livro "óleo das horas dormidas"
bravata
eu sei, meu amor, que contigo aqui no meu colo,
tuas pernas duras, eu não preciso de mais nada,
e eu sei, meu amor, eu sei, todos nós sabemos,
que você está certa, eu sempre sonhei com um amor
que, como você, pudesse me ver escrevendo,
trabalhando no que mais amo e não trocaria nunca,
e eu sei, mamacita, dizemos sempre, ou tentamos,
coisas doces um ao outro, dessas de seguir vivendo,
mas acontece, meu amor, que eu preciso morrer,
eu preciso morrer horrivelmente, vergonhosamente,
eu preciso morrer como morreram meus heróis,
eu preciso morrer numa estrada para o méxico,
eu preciso morrer de tifo, de sífilis, de paixões abissínias,
eu preciso morrer sem deixar nada além de um prêmio nobel
e comentários inteligentes de homens já sem próstata,
enquanto, nos jornais, eles dirão: grande escritor, abençoado
com a capacidade de narras as questões medulares da raça humana,
morre de forma chocante, paródica, um tiro de espingarda na boca,
e isso não será de todo feio, minha paixão, eu espero
que você me entenda, eu não preciso de cura ou benção,
estou abençoado pelas caronas nos trens de carga,
quero estar tremendo um dia, numa estrada de neve,
quero saber quem é quem nesse dia, por essa estrada,
e, sabendo quem é quem, quero tremer de medo, pensar:
vergonha por tudo que pensei ter feito, e sentar,
tocar uma bela punheta no meio do mato e sorrir
com os mesmos velhos dentes dos quais um dia disseram:
um belo sorriso, rapaz intrigante, a febre da raposa,
e quero morrer fulminantemente neste dia, no meio da neve,
mas agora você me dá seus pés, você deita seus pés no meu colo
enquanto escuto higway 61 e isso é tão bom quanto uma bravata,
mas talvez não tanto quanto esta porque, meu amor, eu farei.
Leonardo Marona,
no livro "óleo das horas dormidas"
tuas pernas duras, eu não preciso de mais nada,
e eu sei, meu amor, eu sei, todos nós sabemos,
que você está certa, eu sempre sonhei com um amor
que, como você, pudesse me ver escrevendo,
trabalhando no que mais amo e não trocaria nunca,
e eu sei, mamacita, dizemos sempre, ou tentamos,
coisas doces um ao outro, dessas de seguir vivendo,
mas acontece, meu amor, que eu preciso morrer,
eu preciso morrer horrivelmente, vergonhosamente,
eu preciso morrer como morreram meus heróis,
eu preciso morrer numa estrada para o méxico,
eu preciso morrer de tifo, de sífilis, de paixões abissínias,
eu preciso morrer sem deixar nada além de um prêmio nobel
e comentários inteligentes de homens já sem próstata,
enquanto, nos jornais, eles dirão: grande escritor, abençoado
com a capacidade de narras as questões medulares da raça humana,
morre de forma chocante, paródica, um tiro de espingarda na boca,
e isso não será de todo feio, minha paixão, eu espero
que você me entenda, eu não preciso de cura ou benção,
estou abençoado pelas caronas nos trens de carga,
quero estar tremendo um dia, numa estrada de neve,
quero saber quem é quem nesse dia, por essa estrada,
e, sabendo quem é quem, quero tremer de medo, pensar:
vergonha por tudo que pensei ter feito, e sentar,
tocar uma bela punheta no meio do mato e sorrir
com os mesmos velhos dentes dos quais um dia disseram:
um belo sorriso, rapaz intrigante, a febre da raposa,
e quero morrer fulminantemente neste dia, no meio da neve,
mas agora você me dá seus pés, você deita seus pés no meu colo
enquanto escuto higway 61 e isso é tão bom quanto uma bravata,
mas talvez não tanto quanto esta porque, meu amor, eu farei.
Leonardo Marona,
no livro "óleo das horas dormidas"
tudo é concha
quem acha sem procurar é quem
longamente buscou sem encontrar
(gaston bachelard)
viramos a curva agora e não há lenço
na despedida do que se arrasta conosco,
mas são pedaços tristes de um vietnã
retido em cada célula mas então adeus,
madrugadas com o coração em chamas
nos postos de gasolina de meus anos,
adeus sem pressa, mas por fim adeus,
cúpula tensa de cataclismos telúricos,
chave de braço do perdão e olho roxo,
ronco suave da droga no embalo mítico,
tudo é concha na mandíbula do soalho,
susto cardíaco do amor, suor das veias,
reclame em perdigotos ao céu da fuga,
tempo sem tempo em que o tempo vive
agora afogado na ampulheta do manejo,
rastro sem bicho do que caíram órgãos,
rumor de cimento nos poros da beleza,
azuis as fadas azul a tristeza azul o nada,
agora apenas amarelas as folhas mortas,
velho para a música e novo para calçar
os sapatos que nos cospem és um adulto,
portanto adeus ao que nem lembro e sou,
essa matéria que engole e cospe e somos
o que nos resta dela em cílios trêmulos e
bocas tortas para baixo num cerne rude,
agora já viramos a curva e não há lenço
nos narizes de antigas e dolorosas ninfas,
é passar ao largo e engolir o verde musgo
da vida ainda líquida da primeira latência,
agora que lembrar é o crime da memória
e despedir-se é lançar através da vidraça
os corpos perdidos que um dia pensamos:
têm frio mas, apesar de tudo, veem a luz,
verde entranha tracejada de escuro cínico.
Leonardo Marona,
no livro "óleo das horas dormidas"
cair de amor
é preciso cair de amor,
é preciso, é mais que tempo,
que seja uma terrível queda,
uma intolerável queda de amor.
quando me olho no espelho,
quando fecho ou tiro o cinto,
quando compro bússolas,
quando observo as vitrinas,
quando faço mal a barba
ou não faço a barba por semanas,
quando vejo um gato na chuva
ou me envergonho se karen dalton
enruga meu ventre com microtons,
quando eu me virar assustado,
eu sei, é preciso, não há mais
tempo para fugas, não tenho mais
muito da minha reserva pessoal
de amor e quando pisco nas ruas
ou visto minha nobre jaqueta emprestada
e me atribuo tapinhas de incentivo,
quando fumo como um detetive suíço
ou faço as vezes de comediante asmático,
não pode ser, inevitável, existe prazo
limite para tudo e agora, sim, agora
é mais que preciso cair de amor.
então não venha me falar quando
tivermos percorrido quilômetros
e na hora não soubermos dizer.
cair de amor, não existe a hora,
amor é o que faz cair e caído
permanece aos pés do que aos pés
é preciso cair, nas ruas, em postes,
nas filas dos desempregados,
nas blitz policiais e nos bálcãs,
mesmo em cemitérios é possível,
nas fases de luto ou sem sorte,
bater e cair, quando, suando,
estiverem ainda desempenhados
os pedaços da vertigem solene.
Leonardo Marona
no livro "óleo das horas dormidas"
é preciso, é mais que tempo,
que seja uma terrível queda,
uma intolerável queda de amor.
quando me olho no espelho,
quando fecho ou tiro o cinto,
quando compro bússolas,
quando observo as vitrinas,
quando faço mal a barba
ou não faço a barba por semanas,
quando vejo um gato na chuva
ou me envergonho se karen dalton
enruga meu ventre com microtons,
quando eu me virar assustado,
eu sei, é preciso, não há mais
tempo para fugas, não tenho mais
muito da minha reserva pessoal
de amor e quando pisco nas ruas
ou visto minha nobre jaqueta emprestada
e me atribuo tapinhas de incentivo,
quando fumo como um detetive suíço
ou faço as vezes de comediante asmático,
não pode ser, inevitável, existe prazo
limite para tudo e agora, sim, agora
é mais que preciso cair de amor.
então não venha me falar quando
tivermos percorrido quilômetros
e na hora não soubermos dizer.
cair de amor, não existe a hora,
amor é o que faz cair e caído
permanece aos pés do que aos pés
é preciso cair, nas ruas, em postes,
nas filas dos desempregados,
nas blitz policiais e nos bálcãs,
mesmo em cemitérios é possível,
nas fases de luto ou sem sorte,
bater e cair, quando, suando,
estiverem ainda desempenhados
os pedaços da vertigem solene.
Leonardo Marona
no livro "óleo das horas dormidas"
ando ouvindo belchior
como criança sem pernas mergulho
perplexo sobre o indivisível feixe.
mais que perplexo e, na verdade,
não mergulho, empurram-me na direção
do meu destino de crianças sem pernas,
e sou obrigado a me diluir ou morrer.
a escolha óbvia sobrepõe a resolução
das pendengas, sem chance ou esperança
sinto-me pasmo com o rumo das coisas,
caverna e dinheiro, as duas simbologias
me determinam e me arrancam pedaços.
as pernas que me faltam eu tento forjá-las
na cabeça, e nada me resta a não ser criar
um novo gólem, e então admitir: o futuro
é para os mortos, presente a morte anunciada.
com o que chamo de meu corpo desconhecido
parto como quem arrasta o próprio corpo
que cai do oitavo andar, os fundilhos das calças
esfarelam em contato com a pele que os pernilongos
ávidos por mim não me deixam esquecer que é doce
como doce é minha gangrena quando as hienas
se aproximam e, repentinamente, são muitas
as hienas sedentas de doçura, mitologias suicidas
seduzem meu coração desesperado, converso
com as pessoas e sinto: não há outra chance
a não ser me diluir entre os operários raivosos de londres,
partir é preciso, ou morrer, e morrer é mais preciso que partir,
mas como eu consigo manter os pés no chão! - e que pés?
e que chão? - como é possível que o susto transpareça
tamanha tranquilidade diante das cores novas!
haverá de ser como criança sem pernas.
a raiva será o motor do susto contínuo, os olhos
ficarão bem abertos, a voz (isto é absolutamente necessário)
enlouquecerá a ponto de sumir ou tornar-se súplica do corpo,
então haverá, quem sabe, por fim um corpo a que se fazer ruína,
e a ruína terá então o seu lugar privilegiado de costas para o sol,
e então a carne enfraquecida falará, misturada aos empecilhos
de fluidos alquímicos e graves entorpecentes, que por falta
de força e inegável inclinação ao erro em descrença doce,
como as hienas são doces, crianças sem pernas, meu gólem,
minha invenção em que tampouco me reconheço e, ao contrário,
me sobressai e não anda comigo, porque aqui não andarei
mais comigo, vou me deixar inocular pela raiva dos operários
e fazer com que as palavras tornem-se flores carnívoras,
porque não haverá mais agora o empilhamento
dos pedaços caídos de apenas um dos lados.
trocarei meus pedaços com outros despedaçados
e seremos um enorme corpo de possibilidades de corpo.
esqueceremos um pouco o limite que se avista
do umbral como a face da foice, andaremos até o cansaço,
nem que seja o mesmo caminho, nunca mais sozinhos
e ao mesmo tempo sendo todos um grande acúmulo,
dos nossos pedaços e dos pedaços alheios,
para brotar feito chaga de febre
sobre os ossos da beleza desdentada.
Leonardo Marona
no livro "óleo das horas dormidas"
perplexo sobre o indivisível feixe.
mais que perplexo e, na verdade,
não mergulho, empurram-me na direção
do meu destino de crianças sem pernas,
e sou obrigado a me diluir ou morrer.
a escolha óbvia sobrepõe a resolução
das pendengas, sem chance ou esperança
sinto-me pasmo com o rumo das coisas,
caverna e dinheiro, as duas simbologias
me determinam e me arrancam pedaços.
as pernas que me faltam eu tento forjá-las
na cabeça, e nada me resta a não ser criar
um novo gólem, e então admitir: o futuro
é para os mortos, presente a morte anunciada.
com o que chamo de meu corpo desconhecido
parto como quem arrasta o próprio corpo
que cai do oitavo andar, os fundilhos das calças
esfarelam em contato com a pele que os pernilongos
ávidos por mim não me deixam esquecer que é doce
como doce é minha gangrena quando as hienas
se aproximam e, repentinamente, são muitas
as hienas sedentas de doçura, mitologias suicidas
seduzem meu coração desesperado, converso
com as pessoas e sinto: não há outra chance
a não ser me diluir entre os operários raivosos de londres,
partir é preciso, ou morrer, e morrer é mais preciso que partir,
mas como eu consigo manter os pés no chão! - e que pés?
e que chão? - como é possível que o susto transpareça
tamanha tranquilidade diante das cores novas!
haverá de ser como criança sem pernas.
a raiva será o motor do susto contínuo, os olhos
ficarão bem abertos, a voz (isto é absolutamente necessário)
enlouquecerá a ponto de sumir ou tornar-se súplica do corpo,
então haverá, quem sabe, por fim um corpo a que se fazer ruína,
e a ruína terá então o seu lugar privilegiado de costas para o sol,
e então a carne enfraquecida falará, misturada aos empecilhos
de fluidos alquímicos e graves entorpecentes, que por falta
de força e inegável inclinação ao erro em descrença doce,
como as hienas são doces, crianças sem pernas, meu gólem,
minha invenção em que tampouco me reconheço e, ao contrário,
me sobressai e não anda comigo, porque aqui não andarei
mais comigo, vou me deixar inocular pela raiva dos operários
e fazer com que as palavras tornem-se flores carnívoras,
porque não haverá mais agora o empilhamento
dos pedaços caídos de apenas um dos lados.
trocarei meus pedaços com outros despedaçados
e seremos um enorme corpo de possibilidades de corpo.
esqueceremos um pouco o limite que se avista
do umbral como a face da foice, andaremos até o cansaço,
nem que seja o mesmo caminho, nunca mais sozinhos
e ao mesmo tempo sendo todos um grande acúmulo,
dos nossos pedaços e dos pedaços alheios,
para brotar feito chaga de febre
sobre os ossos da beleza desdentada.
Leonardo Marona
no livro "óleo das horas dormidas"
a barca de niterói
gosto do teu hálito de sono, do cheiro
inconstante de esperma e travesseiro -
me sinto muito bem na barca de niterói.
enquanto todos correm para seus lugares,
lambo meus beiços e cheiro meu bigode,
feliz por um momento apesar das botas
dos mortos que boiam na baía semiextinta.
são mortos que nunca sentiram teu cheiro,
o cheiro de dentro de ti nos bigodes, pobres,
se afogaram porque sempre falta alguma coisa
a um homem quando ele decide deixar as botas
em pleno mar, mas na verdade, não importam
as botas flutuantes - estou feliz porque você
não me dá pressa quando tudo grita pressa!
então me recordo de quando eu acordava
e ia à janela enorme, e a rua já tão cedo
tão cheia de pressa, e eu agora sem nenhuma.
ver você era a voz que diz não tenha pressa,
olhe mais para ela, como dorme sem culpa,
e eu, como bom católico, pecava sem culpa
por te olhar, tua pele oleosa, teu quase ronco,
tua forma espatifada de ser simplesmente tudo,
e tudo me fazia esquecer janela, pressa, carros,
e pensar apenas num nome para um filho, assim,
despreocupadamente, como quem diz eu te amo.
Leonardo Marona
no livro "óleo das horas dormidas"
inconstante de esperma e travesseiro -
me sinto muito bem na barca de niterói.
enquanto todos correm para seus lugares,
lambo meus beiços e cheiro meu bigode,
feliz por um momento apesar das botas
dos mortos que boiam na baía semiextinta.
são mortos que nunca sentiram teu cheiro,
o cheiro de dentro de ti nos bigodes, pobres,
se afogaram porque sempre falta alguma coisa
a um homem quando ele decide deixar as botas
em pleno mar, mas na verdade, não importam
as botas flutuantes - estou feliz porque você
não me dá pressa quando tudo grita pressa!
então me recordo de quando eu acordava
e ia à janela enorme, e a rua já tão cedo
tão cheia de pressa, e eu agora sem nenhuma.
ver você era a voz que diz não tenha pressa,
olhe mais para ela, como dorme sem culpa,
e eu, como bom católico, pecava sem culpa
por te olhar, tua pele oleosa, teu quase ronco,
tua forma espatifada de ser simplesmente tudo,
e tudo me fazia esquecer janela, pressa, carros,
e pensar apenas num nome para um filho, assim,
despreocupadamente, como quem diz eu te amo.
Leonardo Marona
no livro "óleo das horas dormidas"
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