domingo, 26 de abril de 2015

La rubia del Metro

MILONGA TRISTE

Llevaba la manzana
del día en la minifalda;
la tristeza de marzo
en la mirada.

En la estación Balderas
dejó pasar el Metro;
se sentó y sólo vimos
a una niña deshecha.

Casi lloraba y ya casi gemía
la rubita del Metro,
con sus muslos de leche,
su atroz melancolía.

Ay desdichado amor,
escolar y maldito.
¡  Ay la rubia del Metro!

Jamás nadie verá
un dolor como el suyo,
ni angustia parecida
ni tanta soledad...

Efraín Huerta
en Permiso para el amor

Siempre mía

Criatura irresistible, nube, voz de mi sueño,
suave espejo nupcial, escúchame en tu vida,
víveme con tu vida, ámame con tu amor
y déjame a tus plantas como raíz despierta.

Eres el árbol vivo de mi antiguo paisaje,
criatura hecha de amor, amorosa criatura;
eres la estatua dócil y la violenta lluvia,
y eres canto y silencio en mi templo de carne.

Criatura, piel de mi alma y sangre de mis labios;
deja que mi dolor se apoye en tu valiente
y clara juventud; deja que mis deseos
sean el vivo reflejo de tu proprio deseo.

Criatura hecha de besos, criatura siempre mía:
una orquídea en tu cuerpo me llama desde siempre,
y yo la bebo entera con mis labios-cuchillos
y me muero de fiebre sobre tu pecho abierto.

Eres diosa en mi sueño, hembra de mi delirio,
espejo de mi piel y azucena en mis brazos.
Déjame ser la espina nupcial y soberana
de tu soberbia vida. Déjame ser felíz.

Efraín Huerta
en Permiso para el amor

El día

                                                                                         Para Rosarito Ferré

El día ha llegado a mis ojos.
El día que muere es una lluvia dorada.
El día es tierno como el agua. Como el amor que nace.
El día es delgado y dulce. El día es el amor.
El día es una espada. Una rosa caliente.
El día me dijo: Buenos días. Y amé al día.
El día estaba en tus ojos de fino oriente.
El día eran tus ojos oscuros. Tu clara sonrisa.
El día quiso decirme Adiós. Y no me dijo nada.
El día y tú habían llegado a mis ojos.
El día eras tú. Tú eras el Buenos días. Y el Adiós.
El día. Siempre el día. Es decir, siempre tú.

Efraín Huerta,
en Permiso para el amor
5

Amor mío, encuéntrame.
Aislado estoy, sediento
de tu virgen presencia,
de tus dientes de hielo.
Hállame, dócil fiera,
bajo la breve sombra de tu pecho,
y mírame morir,
contémplame desnudo
acechando tu danza,
el vuelo de tu pie,
y vuélveme a decir
las sílabas antiguas del alba:
Amor, amor-ternura,
amor-infierno,
desesperado amor.

6

Amor mío, despiértame
a la hora bendita, alucinada,
en que un hombre solloza
víctima de sí mismo y ábreme
las puertas de la vida.
Yo entraré silencioso
hasta tu corazón, manzana de oro,
en busca de la paz
para mi duelo. Entonces
amor mío, joven mía,
en ráfagas la dicha placentera
será nuestro universo.
Despiértame y espérame,
amoroso amor mío.

Efraín Huerta, 1958,
Órdenes de amor, en Permiso para el amor

El retorno

Las paredes tienen oídos,
vientre y sangue.
Pero que no lo sepa el aire,
que lo ignoren el invierno
y el vendedor de esponjas;
que no se enteren mis fotografías que hablan;
que mi amor, oh montañas, oh cielos,
no levante su voz como raíz dulcísima.

Las paredes tienen oídos,
dientes, venas.
Pero que yo nunca, fumando,
diga su breve nombre de madera.
Que yo nunca sonriendo, pronuncie
su verdad: la cálida verdad.

Porque las paredes, como los sótanos,
tienen grandes oídos de herrumbre y frío,
desesperanza y pavor,
desconsuelo y locura.

Que yo nunca, en voz baja,
diga que he vuelto a amar.

Efraín Huerta
en Permiso para el amor

quarta-feira, 15 de abril de 2015

A Nair e Zaél Abreu

São Paulo, 12 de agosto de 1987

Querida mãe, querido pai,
 não sei mais conviver com as pessoas. Tenho medo de uma casa cheia de pais e mães e irmãos e sobrinhos e cunhados e cunhadas. Tenho vivido tão só durante tantos - quase 40 - anos. Devo estar acostumado.
 Dormir 24 horas foi a maneira mais delicada que encontrei de não perturbar o equilíbrio de vocês - que é muito delicado. E também de não perturbar o meu próprio equilíbrio - que é tão ou mais delicado.
 Estou me transformando aos poucos num ser humano meio viciado em solidão. E que só sabe escrever. Não sei mais falar, abraçar, dar beijos, dizer coisas aparentemente simples como "eu gosto de você". Gosto de mim. Acho que é o destino dos escritores. E tenho pensado que, mais do que qualquer outra coisa, sou um escritor. Uma pessoa que escreve sobre a vida - como quem olha de uma janela - mas não consegue vivê-la.
 Amo vocês como quem escreve para uma ficção: sem conseguir dizer nem mostrar isso. O que sobra é o áspero do gesto, a secura da palavra. Por trás disso, há muito amor. Amor louco - todas as pessoas são loucas, inclusive nós; amor encabulado - nós, da fronteira com a Argentina, somos especialmente encabulados. Mas amor de verdade. Perdoem o silêncio, o sono, a rispidez, a solidão. Está ficando tarde, e eu tenho medo de ter desaprendido o jeito. É muito difícil ficar adulto. Amo vocês, seu filho
                                                           
                                                                                                                                              Caio

Caio Fernando Abreu
(A EPOPÉIA DO AMOR COMEÇA NA CAMA COM OS LENÇÓIS
        DESARRUMADOS FEITO UM CAMPO DE BATALHA)
   é ali que eu começo a nascer para a madrugada & suas
           vertigens onde você meu amor se enrosca em em
meu coração paranóico de veludo verde & as delícias de continentes
alaranjados dormem em seu rosto de pérolas turvas oh tambores do amor
            sem parar rumo às tempestades PLANETÁRIAS & suas
    cachoeiras tristes & pesadas como lágrimas
                gosto de gostar & a tv da alma amanhece bêbada & tenta
                                     dizer alguma coisa

Roberto Piva
no livro Abra os olhos & diga Ah!
(A POLÍTICA DO CORPO EM FOGO DO CORPO EM CHAMAS
  DO CORPO EM FOGO) APAGANDO A LUZ as trevas devoram
            teu corpo em chamas tua boca aberta teu suicídio
   de prazer na grama tuas mãos colhendo meu rosto
   de folhas machucadas na escuridão teu gemido à sombra
                das cuequinhas em flor
                          teus cabelos são solidamente negros

Roberto Piva
no livro Abra os olhos & diga Ah!

terça-feira, 14 de abril de 2015

quem soa não sou eu: é a palavra:
pedra áspera ou faca amolada
é ela quem fala
eu e tu somos no máximo a corda
mais ou menos tensa de uma harpa
ou bandolim de lata
tanto faz: é ela quem sabe a hora
e a forma absurda de tirar a nota
e estuprar o anjo
ninguém é poeta: somos o sonho
da palavra (arquetípico demônio):
eis o humano
Carlos Moreira

Sobre a arte de ser um fantasma

os que vierem (se vierem
não saberemos: o que portanto
é irrelevante) depois de nós
os que nascerem em outro
mundo daqui a duzentos
bilhões de anos e anos-luz
não verão mais as estrelas:
a linha dágua do universo
terá expandido tanto
que as galáxias brilharão
para ninguém: distantes
e inúteis olhos sem espelhos
navegarão sem tramontana
não saberão que surfamos
a explosão na sua onda
que amamos destruímos
escrevemos calculamos
o início luminoso da viagem
:
meu filho de repente
olha o céu a mim sorri:
que sorte nascermos agora e aqui
e eu digo: Sim
Carlos Moreira
inexorável a gravidade
entre as tuas cartilagens
inexorável o silêncio
daquilo que não dirás
porque não há a quem
inexorável o medo
de uma noite enorme
em tua mão fechada
e a sombra que escorre
por baixo da porta
inexorável o sorriso no retrato
mesmo que falso e cotidiano
inexorável a tua morte anunciada
a tua morte antecipada
pelo viés do tédio
inexorável o tempo
que levaste descobrindo o mundo
e o mundo é isso mesmo
inexorável teu próprio medo
teu medo tétrico
de voltar pra casa
inexorável tua vida inteira
tua língua teu corpo
tua palavra
um pouco além de nós
gargalha e cala
algum demônio
Carlos Moreira
: muito cedo ou tarde agora
para a corda no pescoço
para a hora do disparo
para pôr a alma fora
para a festa que acabou
e nem era madrugada
para a bala além do corpo
para o morto na calçada
e sua sombra que se move
para sempre além da escada
: não meter a mão no medo
nem a faca na garganta
existir além do muro
mesmo sendo a pedra dentro
mesmo estando tão por fora
quanto a fome além da fera
quanto o tempo de outro tempo
: e por ser assim excêntrico
(só por ser assim excêntrico)
pôr a roda em movimento
*
Carlos Moreira