domingo, 8 de abril de 2018

Tentativa de ciúme

"Como vai você com a outra?
(...)

Como vai você com a mulher

Comum? Sem nada de divino?
Sem soberana, sem sequer
Um trono (você foi o assassino),

Como vai, meu bem? Tudo a gosto?

E o dia-a-dia — sempre igual?
Como você se arranja com o imposto
Da banalidade imortal?

"Mil sobressaltos, incertezas —

Basta! Vou arrumar um teto!"
Como vai, com quem quer que seja —
O eleito pelo meu afeto?

A comida é melhor, mais familiar?

Diga a verdade. Como vai
Você com a imitação vulgar —
Você, que subiu ao Sinai?

Como é viver com uma estranha?

Você a ama? Não disfarce.
O chicote de Zeus da vergonha
Nenhuma vez lhe zurze a face?

E a saúde, vai bem? Que tal

A vida — uma canção? A ferida
Da consciência imortal
Como a suporta, meu querido?

Como vai você com o adereço

De feira? A taxa é muito cara?
Como é aspirar o pó do gesso
Depois do mármor de Carrara?

(Deus talhado em barro, termina

Em pedaços!) Como é o convívio
Com a milionésima da fila
Pra quem já conheceu Lilit?

As novidades de feira

Se acabaram? Farto de portentos,
Como é a vida corriqueira
Com a mulher terrena, sem sexto

Sentido? Vamos, tudo cor

De rosa? Ou não? Aí, nesse oco
Sem fundo, amor, como vai? Pior
Ou igual a mim com outro?"

Marina Tsvetaieva

tradução de Augusto de Campos

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